quarta-feira, 14 de novembro de 2018

A propósito das 500 vitórias da seleção nacional feminina dos Estados Unidos da América

(Créditos: FPF)
Não tendo sido o continente americano descoberto por portugueses (nem sobre a alçada portuguesa) na memorável época dos Descobrimentos, atrevo-me a dizer que Cristóvão Colombro passou anos suficientes em Portugal a estudar e desenvolver um plano, na altura para alcançar as Índias, por rota alternativa quando “esbarrou” em terra e descobriu o Novo Mundo. Podia ter sido mais uma glória dos navegadores que saíram de Portugal mas o Rei D. João II tinha outros interesses (descobrir um outro caminho que contornasse África, como foi depois alcançado por Vasco da Gama), pelo que não deu ouvidos a Cristóvão Colombo e este virou-se para nuestros hermanos.
Com esta muito resumida introdução histórica atrevo-me a dizer que sem Portugal os Estados Unidos da América (EUA) não existiriam e nem a seleção americana teria alcançado a marca histórica de 500 vitórias em 639 jogos. É um feito fantástico que merece uma celebração ao estilo tipicamente americano como se da descoberta de um novo continente se tratasse.
Mas o que me leva a escrever umas linhas parte de um conjunto de questões do género “E se…”. Note-se que a seleção nacional feminina dos EUA fez o seu primeiro jogo em 1985. Bom, a seleção feminina portuguesa fez o seu primeiro jogo em 1981, quatro anos antes. Daí que:
-  E se, em 1983, a Federação Portuguesa de Futebol não tivesse dado indicação e terminado com as atividades da seleção feminina sem motivo que o justificasse?;
-  E se, a exemplo do que ocorre nos EUA, as jogadoras portuguesas tivessem tido sempre as mesmas condições de crescimento e desenvolvimento das suas qualidades e aptidões?
E se, conseguíssemos alcançar o mesmo número de jogadoras (proporcionalmente ao nossa país, obviamente) que os EUA e, desta forma, “obrigássemos” os clubes a disponibilizar todos os escalões de formação e, ainda,  proporcionar mais e melhores condições às jogadoras da equipa principal?;
-  E se,… podia continuar por aqui fora que não concluiria coisa alguma, a não ser que a seleção portuguesa foi amputada em 10 anos de crescimento.
Mas há factos e certezas que nos permitem assumir, com uma margem de risco controlado que o futuro do futebol feminino nacional só poderá ser risonho, com todos os avanços e recuos inerentes aos processos de crescimento.
Senão vejamos o seguinte. Em 2018 (ano civil e não época desportiva), a seleção nacional AA feminina disputou até ao dia 08/11/2018, 15 jogos internacionais de carácter oficial (5) e o dobro em encontros particulares (10) contra 11 seleções nacionais.
Destes 15 jogos, apenas duas selecções estão abaixo de Portugal no ranking mundial (33º), a Roménia (43º) e a Moldávia (93º). Das selecções que estão acima, apenas três conseguiram derrotar a nossa seleção em 2018: EUA, Itália e Rep. Irlanda. E destas, apenas contra os EUA a seleção nacional nunca conseguiu vencer nenhum dos 7 encontros disputados sendo o resultado mais nivelado o registado no dia 8/11/2018, no Estoril.
Posso dizer que fui uma jogadora afortunada pois defrontei as várias selecções nacionais americanas entre 1994 e 2001 (6 jogos, 6 derrotas, 30 golos sofridos e 0 marcados) mas com um enorme sentimento de impotência face ao poderio norte-americano. O jogo só tinha um sentido, o esforço em tentar prolongar no tempo o aparecimento do 1º golo era o objetivo major e a derrota era certa.Não obstante, em contrapartida ganhava-se muito nestes jogos contra os EUA (e outras selecções de igual calibre): experiência, ritmo de jogo, capacidade competitiva, crescimento colectivo e individual.
Ora, este tem sido exactamente um dos grandes trunfos desta seleção, não só o aumento do número de jogos internacionais, mas especialmente o confronto com selecções teoricamente mais fortes e que desafiam as nossas jogadoras a potenciar as suas capacidades físicas e técnico-taticas.
Convém não esquecer que em 2018, Portugal defrontou, além da campeã mundial em titulo, selecções como a Austrália (6ª do ranking mundial), em dois jogos e não perdeu nenhum. O mesmo com a Noruega (13ª), alcançado uma vitória merecida e, ainda, a China (19º), tendo vencido um e empatado outro. Não pode ser fruto do acaso. A consistência de resultados começa a aparecer gradualmente.
As jogadoras nacionais têm sido colocadas à prova em vários momentos com exigências diferentes e têm sabido dizer “presente” mesmo sabendo que temos uma Liga BPI que fica (ainda) aquém do que se pretende em termos de nível competitivo e que nela competem mais de 70% das atletas que integraram a última convocatória.
Não admira pois, nem aos mais distraídos, que o futebol feminino nacional comece a ter o destaque que merece e necessita para crescer. As jogadoras assim o vão “exigir” através do seu esforço e dedicação em representação das cores nacionais e, também, os adeptos de futebol o que querem é assistir a bons espectáculos sem preocupação de qual o género que o disputa.
Tal como Cristóvão Colombo, as selecções femininas vão desbravar o seu caminho rumo ao sucesso e crescimento sustentado e de lá não mais irão sair.
Eu acredito, e espero que todos os portugueses também!
(MJX)

(publicado originalmente no sítio do Sindicato dos Jogadores)